Jenaro Gajardo Vera, o sexto de nove irmãos, cantor de ópera, amante de telescópios e de mulheres (casou três vezes com uma chilena, uma espanhola e uma suíça), era poeta, pintor e músico. Ia ganhando (mal) a vida como advogado e… era o dono da lua. Sim, leu bem, do único satélite da Terra.
Um dia em 1954, Jenaro foi a uma notária e saiu de lá com um papel histórico, pois tinha um papel que provava que tinha acabado de registar em seu nome a lua.
A história é contada pelo El Mundo e parece algo delirante, mas talvez não seja. Em meados do século XX, quando as nações do mundo ainda não tinham desenvolvido nenhuma legislação sobre a não apropriação do espaço, Jenaro registou em notário a lua por 42 pesos (o equivalente hoje em dia a cinco cêntimos).
O advogado, com aspirações artísticas, nunca a vendeu, considerou sim estar a fazer um “ato poético”. “Não a registei com esse fim. Se obtivesse dinheiro por ela a história ficaria a perder. Quis fazer um ato de protesto poético intervindo na seleção dos possíveis habitantes do satélite e aproveitar para que a humanidade tivesse um pouco mais de paz”, terá dito.
Segundo conta na história revelada pelo jornal espanhol, numa noite de setembro de 1954, Jenaro entrou no Club Talca com intenção de se fazer sócio. Mas durante o jantar, os responsáveis do local informaram-no de que com a sua condição de advogado podia ser aceite, mas não pelo facto de não possuir qualquer património.
“Quando saí fui a caminhar até à praça. Chateou-me que se desse tanta importância às coisas materiais. Parei e olhei para o céu. Vi a lua cheia. Que curioso, pensei, o satélite pertence à Terra, tem dimensões mas nunca ninguém o registou”. No dia seguinte terá ido levar uns documentos a um notário em Talca, César Jiménez Fuenzalida, com a sua pretenção, os dados e as medidas da lua.
O homem ter-lhe-á perguntado se sabia o que estava a fazer. Mas acabou por aceitar, não sem alertar o advogado que daí em diante o iam considerar louco. Ao que Jenaro respondeu que não se importava.
Foram feitas três publicações de aviso no Diário Oficial e como ninguém contestou a situação, voltou à conservatória e registou a histórica escritura, a 25 de setembro de 1954.
“Jenaro Gajardo Vera, advogado, é dono, desde antes do ano 1857, unindo a sua posse com a dos seus antecessores, do astro, satélite único da Terra, com 3.475.00 quilómetros de diâmetro, denominada Lua, e cujos limites por ser esferoidal são: Norte, Sul, Este e Oeste, espaço sideral. O seu domicílio fica fixo na rua 1 oriente 1270 e o seu estado civil é solteiro. Jenaro Gajardo Vera. Carné 1.487.45-K. Ñuñoa. Talca, 25 de setembro de 1954”, pode ler-se no documento.
Com o papel assinado, Jenaro tornou-se dono da lua e voltou ao Club Talca em busca de uma vingança espacial e conseguiu entrar no clube. Para isso só foi preciso registar o único satélite terrestre.
Na altura, a história correu de boca em boca e ainda saiu na imprensa chilena. Um dia, dois inspetores dos Impostos foram enviados para cobrar a Jenaro as contribuições inerentes às suas posses: a lua.
O próprio Jenaro contou a situação numa entrevista dada a uma televisão argentina em 1989. Relatou que os homens o abordaram referindo que era “dono da lua mas não a tinha declarado“, e que isso era “invasão fiscal. Um crime“.
“Muito bem, não vamos complicar as coisas. Vão avaliar a lua primeiro e uma vez que a avaliem, falamos”, terá respondido aos inspetores, fazendo com que estes não voltassem a aparecer.
Uma parte da história, que nunca foi possível comprovar por não haver documentação em que se apoiar, dá conta de que Richard Nixon, na altura presidente dos Estados Unidos, terá enviado, em meados de 1969, uma carta a Jenaro a solicitar autorização para que os astronautas Aldrin, Collins e Armstrong aterrassem com a Apollo 11 no satélite que lhe pertencia.
Antes de morrer, aos 79 anos, em 1998, Jenaro terá deixado em testamento as suas posses ao povo chileno. “Ao meu povo deixo a lua, cheia de amor pelas suas tristezas“.
Em 1967, com a sua permissão, as Nações Unidas firmaram um tratado que proíbe a compra e venda de objetos que se encontrem fora da Terra e que sejam zonas desmilitarizadas. Em julho de 1984 entrou em vigor um acordo internacional em que a Lua é considerada Património Comum da Humanidade.