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Renegado e escondido durante mais de quatro décadas, o filme de Jerry Lewis O Dia Em Que o Palhaço Chorou, que relata o Holocausto, continua a aguçar a curiosidade dos admiradores do comediante, famoso nos anos 60 por sucessos como O Professor Chanfrado (1966) e Jerry Ama‑Seca (1958).

Em janeiro, um documentário da BBC revelou filmagens inéditas da produção, que nunca chegou a ser lançada. Algumas imagens chegaram também a circular pela internet, mas os fãs podem ter que aguardar ainda outra década para ter acesso às filmagens completas.

Os originais da obra foram parar à Biblioteca do Congresso, em Washington, juntamente com todo o acervo de Lewis, que foi adquirido pela instituição.

Em setembro, o então bibliotecário emérito do congresso James Billington afirmou ao USA Today que Lewis impôs um embargo para a divulgação das filmagens, que só podem ser divulgadas em 2026.

As cenas foram gravadas no início dos anos 70, num momento alto da carreira de Lewis, que escreveu o argumento e dirigiu o projecto.

O filme conta a história fictícia de um palhaço chamado Helmut Doork, que, ao ser preso por soldados nazistas, passou a entreter crianças enquanto as conduzia até câmaras de gás.

(dr) BBC

A BBC contou "A História de O Dia em que o Palhaço Chorou" num documentário apresentado por David Schneider

A BBC contou “A História de O Dia em que o Palhaço Chorou” num documentário apresentado por David Schneider

Algumas pessoas que trabalharam no filme foram ouvidas pelo actor e realizador David Schneider, que apresentou A História de O Dia Em Que o Palhaço Chorou, o documentário da BBC que resgata trechos da obra.

Entre os entrevistados do documentário está o actor sueco Lars Amble, que morreu em agosto de 2015, e que aparece no filme de Lewis no papel de um policial nazista.

No documentário da BBC, Amble relembra ter sido recrutado por Lewis, que o chamou ao quarto de um hotel em Estocolmo, onde estava hospedado na altura, e lhe disse: “Eu sei o papel que vais fazer. Será o de um tipo realmente mau“.

Pela fama de Lewis na época das filmagens, a produção do filme foi assunto bastante comentado na Suécia, diz Erik Kotschack, filho de um produtor local que colaborou nas gravações, feitas num antigo campo de concentração.

A produção despertou desde sempre o interesse do público. Supostas cópias do argumento do filme circulam pela internet, e houve várias tentativas de reencenação do filme.

Jan Lumholdt, crítico de cinema baseado na Suécia, considera que uma das razões por trás do interesse em torno do filme é o facto de que, até agora, muito poucas pessoas tiveram acesso ao material.

Lewis é um comediante e esse é o filme mais sério que ele já fez“, diz Lumholdt. “Sempre achei que há incontáveis exemplos de grandes actuações e obras sombrias vindas de comediantes, existe um certo apelo nisso,” avalia.

Há muitos filmes sobre o Holocausto, mas há uma certa dificuldade em aceitar uma história de ficção que tem como pano de fundo um dos períodos mais difíceis da história.

Web Summit / Flickr

David Schneider, o ator que apresentou o documentário da BBC, é também comediante, e filho de sobreviventes do Holocausto

David Schneider, o ator que apresentou o documentário da BBC, é também comediante, e filho de sobreviventes do Holocausto

Mas Yael Fried, director de projectos do Museu do Judaísmo em Estocolmo, diz ser favorável a tais obras.

“Precisamos de ângulos e métodos diferentes para compreender o holocausto e a ficção pode ajudar-nos a fazer isso”, diz.

“Podemos explorar personagens fictícias num ambiente real, mas é preciso ter cuidado para deixar bem claro que se trata de ficção,” acrescenta.

Há cerca de 3 anos, foram também divulgadas pela primeira vez as imagens de “Memória dos Campos“, um filme “demasiado chocante” de Hitchcock sobre o Holocausto, que esperou 70 anos para ser lançado. Neste caso, as imagens não eram ficção.

David Schneider, o actor que apresentou o documentário da BBC, é também comediante, e filho de sobreviventes do Holocausto. Schneider conta que a sua mãe, uma actriz, conseguiu fugir de Viena em 1938 juntamente com o pai, um dramaturgo.

Sempre fui muito consciente sobre o Holocausto, desde pequeno”, conta.

“Como comediante, sempre fui fascinado sobre como podemos fazer comédia em cima de um assunto tão delicado,” diz o actor britânico.

“Costumava actuar em shows de comédia judia e lembro-me que certa vez me passaram um bilhete no camarim que dizia ‘Somos de uma caravana de sobreviventes de Auschwitz e viemos para o ver, seria possível dar-nos um olá durante a sua actuação?‘”.

Schneider confessa que não sabia como reagir. “O que é que eu faço? Vou lá e grito: ‘Olá pessoal, há aqui hoje alguém de Auschwitz?‘”

O apresentador afirma que muitos comediantes judeus acabaram por explorar essa área. “Precisamente porque isso é algo tão central nas suas identidades”, explica.

O documentário mostra cenas inéditas de Lewis, entrevistado nos bastidores.

“A comédia é a nossa válvula de escape. Sem ela, acho que desapareceria, evaporaria”, diz o comediante.

ZAP / BBC  [ IMDB / Wikipedia ]

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