Assisti no passado dia 27 de fevereiro, no auditório do DN, na Avenida da Liberdade, 266, ao que julgo ter sido o último dos debates que, em boa hora, o Diário de Notícias decidiu levar a cabo, após as investigações que efetuou sobre o chamado “caso Casa Pia”, que atingiu 10 anos desde que foi despoletado. Daí ter como título “Casa Pia, 10 anos depois”. Foi moderador o jornalista João Céu e Silva. O painel era constituído pelo inspetor Carlos Anjos (PJ) e presidente da Comissão de Proteção às Vítimas, a Drª. Catalina Pestana, ex-provedora da Casa Pia, o Dr. Juiz Edgar Lopes, o advogado do médico Ferreira Diniz e um ex-aluno da Casa Pia, ele próprio, vítima, e autor de um livro já publicado.
Muitos dos presentes na sala pensavam que a pedofilia era algo que ocorria há relativamente pouco tempo. Lembravam-se de um caso na Bélgica, outro nos Açores, anteriores e pouco mais. Pelo menos no que me diz diretamente respeito, apanhei um banho de História quando, dada a palavra a Catalina Pestana, ela referiu ter a instituição foco do debate, sido fundada em 1780, para albergar os órfãos após o Terramoto. Depois ficou a saber-se em 1832 um afilhado do Rei D. Miguel já abusava dos alunos da Casa Pia, alguns já então adultos. A Polícia não atuava, por se tratar de um afilhado do rei. Ao chegar aos ouvidos deste, ele pensou pedir conselho sobre o que fazer ao afilhado. Por sugestão da Polícia, já que partiria dentro de dois dias um barco para a India, informou disso D. Miguel, que não hesitou e meteu nesse barco o afilhado.
Mais fiquei a saber que a Casa Pia comemorará a 3 de Julho 100 anos sobre a sua inauguração, altura em que os antigos alunos, como em anos anteriores, se reúnem num almoço de confraternização que tem sempre como ementa massa com grãos. Este era o prato que então se comia e que os alunos fazem questão em recordar.
Do debate também transpareceu que a Justiça, desta vez atuou como podia, face aos condicionalismos e daí que tenha voltado a mim alguma confiança que já se estava a desintegrar!
Acresce ainda que o Tribunal Constitucional acaba de rejeitar um pedido de aclaração suscitado pelo médico Ferreira Diniz, por entender que não há nada a esclarecer relativamente ao acórdão que indeferiu os recursos dos arguidos. Esta decisão vai fazer com que tenham que cumprir as respetivas penas o citado médico, sete anos, Carlos Cruz, seis, Jorge Ritto, seis e oito meses e Manuel Abrantes, cinco anos e nove meses.
A Drª. Catalina Pestana não se coíbe de descrever factos que lhe foram descritos em diferentes ocasiões e de não compreender a razão por que não foram apurados aqueles que se passaram na “casa dos RR” onde, ao que consta, havia orgias a que não faltava heroína à descrição. Referiu igualmente que dos cerca de 100 pedófilos conhecidos (com nomes, se necessário), só foram mencionados trinta! Todos estes indivíduos foram e continuam “a ser predadores”. Existe um relatório do SIS que refere que estes indivíduos pertencem praticamente a todos os partidos políticos.
Os factos remetidos pela PJ de Lisboa, para a comarca do Porto, foram todos, não se sabe bem porquê, arquivados.
Este é mais um triste episódio na vida de uma instituição que, tal como a igreja católica, deveria estar bem longe de este tipo de “novelas”. Que ao fazer-se, finalmente, JUSTIÇA, isso contribua um pouco para uma melhoria da panorâmica social e política em Portugal.
Crónica do Crime**Por Dominick George**07/03/2013
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