A manifestação convocada na Rocinha para cobrar o governo do Estado pelo desaparecimento do pedreiro Amarildo de Souza interrompeu o trânsito no túnel Zuzu Angel no início da noite desta quinta-feira, no Rio de Janeiro. Uma hora após a convocação, poucos moradores e simpatizantes tinha chegado. Os filhos do pedreiro não se juntaram ao movimento. Eles deveriam prestar depoimento no mesmo horário. Apenas Elisabete Gomes da Silva, mulher de Amarildo, desceu para a entrada da comunidade para participar do protesto, junto com cerca de 150 pessoas.
Líder comunitário, Eduardo Souza, o Dudu, reclamou da ação dos policiais da Unidade dePolícia Pacificadora (UPP) e disse que Amarildo é apenas mais um caso que as comunidades
pacificadas estão acostumadas. “Ficamos décadas abandonados e até hoje os serviços essenciais continuam sem chegar”, reclamou.
Dudu, como é conhecido, esteve à tarde no Ministério Público em uma reunião entre familiares de Amarildo, o delegado responsável pela investigação, Rivaldo Barbosa, e o promotor do caso, Homero de Freitas. “O que vivemos aqui depois da UPP são tempos de muito abuso policial, muita porta arrombada. Não podemos nos manifestar que somos reprimidos”, reclamou.
Em apoio a familiares de Amarildo surgem pessoas como Deise Carvalho, moradora do Cantagalo, em Copacabana e que em 2008 teve o filho, Andreu, morto, segundo ela, por policiais que o detiveram como suspeito.
“Estou aqui para apoiar a família do Amarildo. Cadê o Amarildo? Cadê a engenheira Patrícia Amieiro”, disse lembrando do caso da jovem quedesapareceu após ser parada em uma blitz da polícia na entrada da Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio.
Os poucos manifestantes que se concentraram na entrada da Rocinha usavam camisetas com os dizeres “Favela não se Cala” e alguns cartazes em apoio à família do desaparecido. “Ele (Amarildo) está morto. Você acha que com toda essa manifestação ele já não teria aparecido? Ninguém me deu nenhuma resposta até agora. Foi a UPP que matou meu marido. Ele era trabalhador e sumiram até com os documentos dele. Tenho filhos para criar e ninguém me dá uma resposta”, criticou Elisabete.
Para o líder comunitário André Luiz Souza, do grupo A Favela Não se Cala, não há dúvidas de que o pedreiro foi morto pelos policiais. “Creio que o corpo do Amarildo não será mais encontrado. Tenho certeza absoluta de que o crime foi cometido pelas mãos do Estado”, disse.
Policiais militares acompanham o protesto, mas sem intervir diretamente. O secretário estadual de Segurança, José Mariano Beltrame, disse ontem que também deseja saber o que aconteceu com o pedreiro.
Protestos contra tarifas mobilizam população e desafiam governos de todo o País
Mobilizados contra o aumento das tarifas de transporte público nas grandes cidades brasileiras, grupos de ativistas organizaram protestos para pedir a redução dos preços e maior qualidade dos serviços públicos prestados à população. Estes atos ganharam corpo e expressão nacional, dilatando-se gradualmente em uma onda de protestos e levando dezenas de milhares de pessoas às ruas com uma agenda de reivindicações ampla e com um significado ainda não plenamente compreendido.
A mobilização começou em Porto Alegre, quando, entre março e abril, milhares de manifestantes agruparam-se em frente à Prefeitura para protestar contra o recente aumento do preço das passagens de ônibus; a mobilização surtiu efeito, e o aumento foi temporariamente revogado. Poucos meses depois, o mesmo movimento se gestou em São Paulo, onde sucessivas mobilizações atraíram milhares às ruas; o maior episódio ocorreu no dia 13 de junho, quando um imenso ato público acabou em violentos confrontos com a polícia.
A grandeza do protesto e a violência dos confrontos expandiu a pauta para todo o País. Foi assim que, no dia 17 de junho, o Brasil viveu o que foi visto como uma das maiores jornadas populares dos últimos 20 anos. Motivados contra os aumentos do preço dos transportes, mas também já inflamados por diversas outras bandeiras, tais como a realização da Copa do Mundo de 2014, a nação viveu uma noite de mobilização e confrontos em São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Salvador, Fortaleza, Porto Alegre e Brasília.
A onda de protestos mobiliza o debate do País e levanta um amálgama de questionamentos sobre objetivos, rumos, pautas e significados de um movimento popular singular na história brasileira desde a restauração do regime democrático em 1985. A revogação dos aumentos das passagens já é um dos resultados obtidos em São Paulo e outras cidades, mas o movimento não deve parar por aí. “Essas vozes precisam ser ouvidas”, disse a presidente Dilma Rousseff, ela própria e seu governo alvos de críticas.
EM TERRA.COM.BR Por Marcus Vinicius Pinto/Português do Brasil