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Fraturas nos antebraços, nos crânios e nas mandíbulas dos esqueletos de escravos do século XV revelam a possível violência que estes sofriam, afirma investigadora do projeto que estuda os 158 esqueletos encontrados em Lagos em 2009.

Cerca de um terço dos esqueletos encontrados apresenta lesões traumáticas – algumas poderão estar relacionadas com acidentes de trabalho, outras com episódios de violência -, disse à agência Lusa Teresa Ferreira, uma das quatro investigadoras do Laboratório de Antropologia Forense da Universidade de Coimbra que estudam aquela que é uma das “mais antigas” coleções do mundo de indivíduos escravizados e a única de grandes dimensões que se conhece na Europa.

A grande maioria dos esqueletos serão de indivíduos do século XV, encontrados numa lixeira urbana da época fora das muralhas de Lagos, cidade que se assumiu como o primeiro posto de desembarque europeu de escravos.

No estudo desenvolvido, foram identificadas fraturas nas mandíbulas, antebraços e crânio dos escravos que são “altamente sugestivas” dos episódios de violência e maus tratos que estes indivíduos sofreriam, sublinhou.

De acordo com Teresa Ferreira, as lesões identificadas em vários esqueletos no antebraço direito podem ter como explicação o movimento instintivo de se levantar o braço direito (caso a pessoa seja destra) para proteger a cabeça.

“É um traumatismo que está muito associado a situações violentas”, explanou a investigadora que integra o grupo de investigação que apresenta esta terça-feira a conferência “Os Escravos do Vale da Gafaria: o que nos dizem os seus ossos“, a realizar às 19h, no Centro Cultural de Lagos.

O estudo identificou ainda hérnias, lesões nas mãos e pés, fraturas nas pernas, possíveis casos de brucelose, deficiências nutricionais, bem como sinais de doenças degenerativas como a artrose.

Dos 158 esqueletos encontrados, 107 são adultos e 49 crianças (não foi possível classificar dois dos esqueletos), sendo que 52% dos escravos eram mulheres e a maioria terá morrido antes dos 30 anos, contou.

Durante o estudo, concluiu-se que os escravos vieram da África subsariana, provavelmente das regiões da Guiné e do Congo.

Segundo Teresa Ferreira, os escravos não terão chegado “na primeira grande leva” mencionada nas crónicas de Gomes Eanes de Zurara, mas estarão “nos primórdios do tráfico negreiro”, podendo ter estado em Lagos ainda durante a vida de Infante D. Henrique.

O facto de terem sido atirados para uma lixeira urbana, alguns amarrados, “é indicativo de que deveriam ser dos primeiros escravos a aportar em Portugal” – posteriormente, os escravos eram batizados e enterrados num cemitério.

A investigação, que começou em 2015 e termina em 2017, trabalhou em torno das lesões traumáticas que os indivíduos sofreram, bem como na identificação do perfil biológico e dentição dos mesmos.

Para Teresa Ferreira, “terá de haver uma continuidade” do estudo desta coleção de esqueletos.

“As fontes históricas são muito importantes, mas são escritas só por uma parte de quem viveu a história. Os ossos permitem confirmar ou reescrever os acontecimentos. Vêm contar a história direta” dos escravizados, realçou.

/Lusa

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