FOTO: LAFFAZ.COM // BLOOMBERG
O conceito dos Estados em Rede pretende acabar com os Estados-nação e criar países que operam como empresas que prestam serviços.
Num futuro não muito distante, a ideia de escolher a sua cidadania poderá assemelhar-se à facilidade com que alguém escolhe um fornecedor de serviços.
Esta é a visão revolucionária de Balaji Srinivasan, um renomado empresário no mundo das criptomoedas, que propõe uma nova era de “Estados em Rede”, onde comunidades se formariam inicialmente online, baseadas em interesses comuns, e eventualmente adquiririam terras para se tornarem estados-nação com leis próprias.
Esta proposta radical, apresentada por Balaji numa conferência em Amesterdão, visa criar uma alternativa aos atuais Estados-nação, substituindo as suas funções tradicionais por startups de tecnologia.
Nações emergentes criadas na base da internet seriam tão acessíveis quanto escolher um fornecedor de internet, e os cidadãos poderiam trocar de país com a mesma facilidade com que trocam de serviços online. Segundo Balaji, este modelo de “Estado em Rede” poderia, um dia, substituir completamente os governos atuais.
Empresas com influência excessiva sobre nações não são novidade. A história da United Fruit Company, que governou a Guatemala com o apoio da CIA, é um exemplo clássico. Contudo, a visão de Balaji vai além de influenciar governos: propõe que empresas criem e governem os seus próprios países, rompendo de vez com o conceito de Estado soberano.
A ideia, no entanto, não está isenta de críticas. Muitos vêem o “Estado em Rede” como um projecto neocolonial que substituiria governos eleitos por corporações que agiriam em benefício dos seus accionistas. Outros, no entanto, consideram esta visão uma forma de escapar à burocracia dos Estados democráticos tradicionais.
Estes projetos já estão em andamento, com comunidades emergentes como Cabin, Culdesac e Próspera. Cabin, por exemplo, é uma “cidade em rede de aldeias modernas” com filiais nos EUA e em Portugal. Próspera, por sua vez, é uma cidade privada numa ilha de Honduras, que promete tratamentos experimentais para a longevidade e governa-se pelas suas próprias leis, graças a uma classificação especial concedida pelo governo anterior de Honduras.
Enquanto estas iniciativas continuam a ganhar tração, há quem veja perigos nesta tendência. A ideia de substituir os Estados-nação por corporações pode abrir portas para regimes totalitários, onde ditadores corporativos substituiriam líderes eleitos.
Esta crítica é reforçada por movimentos como o de Dryden Brown, que deseja criar uma cidade-Estado no Mediterrâneo, governada por blockchain, com princípios baseados na vitalidade e na virtude heróica. O projecto chama-se Praxis e os cidadãos podem inscrever-se para se mudarem até 2026.
Brown e os seus apoiantes representam um nicho de inovação radical no movimento dos Estados em Rede e organizam eventos exclusivos, como uma festa em Nova Iorque, onde figuras ligadas ao “Iluminismo das Trevas” e adeptos de criptoativos se reuniram. No entanto, as suas ideias, muitas vezes associadas a símbolos de extrema-direita, levantam questões sobre as verdadeiras intenções deste movimento.
No final de contas, embora estas comunidades ainda estejam nas fases iniciais de formação, o crescimento de zonas económicas especiais, cidades autónomas e territórios digitais parece sugerir que as fronteiras entre o Estado e as empresas estão a tornar-se cada vez mais nebulosas.
A ascensão das criptomoedas e das tecnologias descentralizadas pode muito bem acelerar este processo, e a pergunta que se coloca é se estamos preparados para este futuro de “nações emergentes” sem governança tradicional.
// ZAP